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Pedro Siza Vieira: Prazo de insolvência pessoal “cai de 5 para 2 anos e meio”
JORNAL DE NEGÓCIOS


Governo quer dar “segunda oportunidade” às pessoas singulares, como empresários em nome individual. Medida retira proteção aos credores e ministro pede maior “responsabilidade” na concessão de crédito.

O Governo prepara-se para apresentar à Assembleia da República uma proposta de lei que visa alterar o Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas (CIRE). Uma das medidas previstas é a redução do prazo de exoneração do passivo restante, de cinco anos para 30 meses, o que permitirá que as pessoas singulares que declarem insolvência fiquem menos tempo sujeitas à obrigação de afetar os rendimentos ao pagamento de dívidas. Por outro lado, os credores ficam menos protegidos. “São as regras do jogo” e, por isso, os credores terão de ter “maior atenção” ao conceder crédito, diz Pedro Siza Vieira.

Quais são as expectativas de prazos para as alterações ao CIRE? Já houve alguma discussão com alguns partidos?

Estes tópicos vêm de discussões ao nível da comunidade académica, da magistratura e do sistema político. Eu e a ministra da Justiça estamos à disposição dos grupos parlamentares para explicitar de que forma estes objetivos, que vêm de trás, serão concretizados. Quanto mais cedo estas regras estiverem em vigor, mais robusta será a capacidade do sistema para se preparar para um eventual aumento das insolvências. Há ainda duas notas importantes nesta proposta, na perspetiva das pessoas singulares. A primeira define que as dívidas de uma empresa insolvente que resultem da cessação de contratos de trabalho são dívidas de insolvência, portanto, estão à frente dos créditos da massa insolvente. Isto dá grande segurança aos trabalhadores em caso de insolvência.

E a outra?

Reduzimos o prazo da chamada exoneração do passivo restante de cinco anos para 30 meses. Hoje, quando uma pessoa singular se declara insolvente, está obrigada, durante o período posterior à declaração da insolvência, a que todos os seus rendimentos e património fiquem afetos ao pagamento das dívidas anteriores à insolvência. Aquilo que estabelecemos nesta proposta de lei é que este período se reduz para dois anos e meio, dando uma segunda oportunidade às pessoas singulares para, após uma declaração de insolvência, poderem seguir com a sua vida. Muitos empresários em nome individual e muitos sócios de empresas que tiveram de avalizar as dívidas da empresa ficam sobrecarregados com dívidas que os acompanham durante muito tempo, sem terem a oportunidade de seguir em frente.

O que é que essa medida significa para os credores?

Significa que, ao fim de dois anos e meio, deixam de poder receber o rendimento do devedor insolvente. Há uma redução daquilo que seria, de outra forma, uma sobrecarga. Mas isto também obriga a uma maior atenção que os credores têm de ter no momento de concederem crédito. Estas regras são importantes para termos uma economia dinâmica. Uma economia dinâmica é aquela que permite às pessoas arriscar, sabendo que, se as coisas correrem mal, poderão ser declaradas insolventes, mas têm uma segunda oportunidade. Uma economia que não dá segundas oportunidades aos agentes económicos, que continua a onerá-los por demasiado tempo, é uma economia que se torna hostil ao risco, torna-se hostil a que as pessoas tenham incentivos para ir à procura de novas oportunidades. Este mecanismo é uma proteção dos devedores que sejam pessoas singulares, mas também cria as condições para uma economia mais dinâmica.


Mas também deixa os credores mais desprotegidos.

São as regras do jogo. Os credores também têm responsabilidade no momento de conceder crédito. A insolvência é uma história de séculos. Criámos o regime das sociedades de responsabilidade limitada, para que se fizessem operações de maior dimensão que não comprometessem o património das pessoas singulares; criámos o regime da insolvência para permitir que os credores sejam pagos com aquilo que a massa insolvente é capaz de fazer; acabámos com a prisão por dívidas. Todos estes são fatores que fomos consolidando e que criam as condições para uma economia mais dinâmica e com mais apetite pelo risco.

Quando contam ter a legislação em vigor?

Espero que, no primeiro trimestre do próximo ano, tenhamos esta legislação em vigor. Se não conseguirmos fazê-lo, o país fica menos preparado para a próxima etapa da nossa vida e é uma reforma estrutural que fica por fazer.

“Uma economia que não dá segundas oportunidades torna-se hostil ao risco.”

“Este mecanismo cria as condições para uma economia mais dinâmica.”

“Credores terão de ter maior atenção no momento de conceder crédito.”

“Muitos empresários em nome individual ficam sobrecarregados com dívidas durante muito tempo.”

“Espero que esta legislação esteja em vigor no primeiro trimestre de 2022.”

“Se não conseguirmos fazê-lo, o país fica menos preparado para a próxima etapa da nossa vida.”