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Imobiliárias e especialistas afastam risco de bolha
JORNAL DE NEGÓCIOS


O novo contexto de inflação alta e subida das taxas de juro do Banco Central Europeu (BCE) – e de aumento da Euribor – não deverá provocar uma bolha imobiliária nem colocar riscos à estabilidade dos bancos, acreditam protagonistas dos dois setores. Fora do horizonte próximo está também a redução dos preços na habitação, embora as vendas se possam tornar mais demoradas e a procura possa retrair. No sistema financeiro, o curto prazo deve fazer sorrir os CEO: a subida das taxas diretoras do BCE deverá ter um impacto positivo na margem financeira das instituições. O malparado pode subir, mas apenas em 2023 é que pode acontecer de forma significativa.
Apesar dos aumentos acentuados nos preços do mercado da habitação, da subida recente das taxas de juro e da Euribor a que se soma o aumento da inflação – que acentua a perda do poder de compra das famílias –, as imobiliárias e os especialistas do setor afastam a curto e médio prazo o cenário de bolha no setor. Sobretudo no segmento residencial de luxo.

Fora das previsões apontadas pelas imobiliárias fica ainda uma descida de preços acentuada na habitação. Sem um aumento da carteira de imóveis no mercado, os preços não vão descer, dizem em uníssono as imobiliárias que sublinham que a procura está muito acima da "escassa" oferta.

"Os critérios de financiamento bancário são muito mais conservadores do que no passado, nomeadamente, pelas taxas de esforço inferiores a 34% e LTV [taxa de financiamento em relação ao valor do imóvel] máximas de 80%", aponta ao Negócios Ricardo Sousa, CEO da Century21 em Portugal. Com esta posição da banca "as famílias estão menos endividadas e com maiores níveis de poupança", acrescenta ainda Ricardo Sousa. O mesmo diz Cristina Arouca, diretora de Research & Data Intelligence da CBRE Portugal: "O benefício da última crise económico-financeira foi deixar os bancos mais alerta e criteriosos na atribuição de crédito." E esta é a razão apontada ao Negócios por todas as imobiliárias para afastarem o cenário de bolha.

Num horizonte imediato, o impacto da conjuntura de aumento de taxas e preços pode passar por uma retração do mercado imobiliário, dilatando o período de venda dos imóveis, apontam as imobiliárias.

Em média, em 2021, a Century21 vendeu imóveis dentro de 45 dias, e com o cenário atual "é expectável que o tempo médio de venda aumente", disse ao Negócios o CEO Ricardo Sousa.

Já a Savills, no ano passado vendia, em média um imóvel em seis a dez meses. Agora este prazo pode dilatar porque "as famílias serão mais cautelosas e prudentes" antes de avançarem com a compra. Além disso, "as entidades bancárias exercerão regras mais restritas de acesso ao crédito que irão atingir especialmente as famílias da classe média, com rendimentos mais baixos", diz ao Negócios Alexandra Portugal Gomes, head of Research & Communications da Savills.

Procura pode descer
Caso a inflação continue elevada durante um período prolongado, "podemos vir a observar alguma redução das vendas de habitação não uniforme territorialmente", prevê ao Negócios Joaquim Montezuma de Carvalho, professor convidado do ISEG na área de Finanças Imobiliárias e sócio-gerente da ImoEconometrics. Uma redução da procura deverá ser "mais notória nos mercados de habitação dirigidos aos compradores nacionais e em produtos para a classe média", acrescenta ainda o especialista.

Esta redução na procura pode vir a acelerar a tendência de num "futuro próximo" assistirmos "à estabilização dos preços da habitação, ou, pelo menos, uma moderação do seu ritmo de subida", aponta Rui Torgal, CEO da ERA Portugal, defendendo que "a atual taxa de crescimento dos preços em Portugal, particularmente nas grandes cidades e para a classe média portuguesa, é insustentável".

Já Cristina Arouca da CBRE diz que com o aumento das taxas de juro, o arrendamento pode vir a ser "uma alternativa mais atrativa, levando a um aumento do número de famílias que opta por este modelo em vez da compra".

Descida de preços só com mais imóveis
Esta contração na procura é uma "probabilidade não desprezável" mas isso "não implica necessariamente uma redução dos preços", aponta Montezuma de Carvalho.

"A escassez de habitação é um dos principais fatores de aumento dos preços", reforça Patrícia Barão, head of Residential da JLL. Entre 2011 e 2021, foram concluídos 13.540 novos fogos. O que contrasta com os 79.560 novos fogos por ano durante a década anterior.

E, de futuro, esta tendência deverá continuar. "Não é expectável que o número de casas novas a entrar no mercado altere a atual situação do ‘stock’ em oferta", alerta Joaquim Montezuma de Carvalho.

Mas além da escassez da oferta, para Beatriz Rubio, CEO da Remax Portugal, a subida dos preços da habitação – que, segundo a OCDE, aumentaram 68% desde 2015, acima da média de 45% na OCDE e de 34% na UE – resulta ainda de um "mercado de arrendamento pouco concorrencial" e do "investimento estrangeiro que vê no nosso mercado uma oportunidade segura".

Já o mercado residencial de luxo vai sofrer um impacto reduzido, porque este segmento "recorre muito pouco a financiamento", pelo que o impacto "será baixo ou praticamente inexistente", aponta Miguel Poisson, CEO da Portugal Sotheby’s Realty.

O mesmo diz Miguel Lacerda, Lisbon Residential Director da Savills, frisando que no segmento de luxo "o poder de compra é elevado e o índice de endividamento relativamente baixo".