Notícias



Governo vai avançar com mudanças à lei laboral mesmo sem ter conseguido acordo na Concertação Social
Jornal Económico sapo


A ministra do Trabalho, Ana Mendes Godinho, deu por fechada esta quarta-feira a discussão com os parceiros sociais sobre a Agenda do Trabalho Digno e, ainda que não tenha sido possível chegar a acordo em sede de Concertação Social, o Governo pretende aprovar em junho no Conselho de Ministros este pacote de medidas que alteram a legislação laboral, seguindo, depois, para a Assembleia da República.

“Hoje [esta quarta-feira] concluímos na Concertação Social o processo, que tem sido longo e muito participado, de discussão da Agenda do Trabalho Digno. É um dia muito importante para o país, os trabalhadores e os jovens, porque temos aqui um conjunto de medidas transversais, que procuram responder aos desafios que temos no mercado de trabalho”, sublinhou a ministra, em declarações aos jornalistas, à saída da reunião com as confederações patronais e as centrais sindicais.

Segundo explicou a ministra, este pacote passará agora das mãos dos parceiros sociais para a esfera do Governo, prevendo-se que a aprovação em Conselho de Ministros aconteça já em junho, “para seguir os trâmites para ser enviado para a Assembleia da República para ser discutido aí”.

A expectativa de Ana Mendes Godinho é a de que as normas em questão (como a criminalização do trabalho não declarado e o reforço da compensação por cessação de contrato de trabalho a termo) produzam efeitos ainda este ano.

Convém explicar que a Agenda do Trabalho Digno já tinha sido discutida na Concertação Social em 2021, não tendo sido possível, nessa altura, fechar um acordo nessa sede.

Ainda assim, e à semelhança do que acontecerá agora, o Governo levou as medidas a Conselho de Ministros, tendo adicionado a esse pacote outras que tinha negociado com a esquerda, de modo a viabilizar a aprovação do Orçamento do Estado para 2022. A proposta orçamental acabou, contudo, por ser chumbada, resultando na antecipação das eleições legislativas.

Agora, já com a maioria absoluta garantida no Parlamento, o Governo fez regressar este mês à Concertação Social a Agenda do Trabalho Digno, para discutir com os parceiros sociais as medidas que foram negociadas à esquerda (isto é, o referido aumento da compensação por cessação de contrato a termo e o reforço da arbitragem para evitar vazios na cobertura da negociação coletiva).

A primeira reunião sobre esta matéria deu-se há duas semanas, no dia 11 de maio, e, entretanto, os parceiros sociais apresentaram os seus contributos ao Governo. Já esta quarta-feira, deu-se a segunda e última reunião sobre a Agenda do Trabalho Digno, não tendo sido possível chegar a um acordo.

Da parte da Confederação Empresarial de Portugal (CIP), António Saraiva frisou, em declarações aos jornalistas, que o Governo “não procurou acordo” com os parceiros sociais e adiantou que os patrões estão abertas para, na contratação coletiva, absorver algumas das medidas que estiveram em cima da mesa. “Este texto foi encontrado para agradar, na altura, [os partidos mais à esquerda]”, fez questão de lembrar o responsável, que indicou ainda que, das dez linhas vermelhas identificadas pela CIP, o Governo endereçou quatro.

Já da parte da Confederação do Turismo de Portugal (CTP), Francisco Calheiros salientou que este foi um processo que “já começou mal”, tendo terminado com uma Agenda que “não oferece nenhuma satisfação”.

Na mesma linha, e em nome da Confederação do Comércio e Serviços de Portugal (CCP), João Vieira Lopes frisou que estas medidas vão introduzir “restrições e dificuldades” às empresas, daí merecer um parecer desfavorável.

Quanto aos sindicatos, a CGTP, pela voz de Isabel Camarinha, insistiu que as propostas do Governo não dão resposta aos problemas dos trabalhadores (nomeadamente, no que diz respeito à precariedade) e até a UGT, pela voz de Mário Mourão, admitiu que a Agenda do Trabalho Digno ficou aquém das expectativas. “Há uma oportunidade perdida de dignificar o trabalho”, observou este último sindicalista, que propôs prolongar a discussão para encontrar melhorias neste pacote, tendo o Governo rejeitado.

Confrontada com a oposição demonstrada pelo parceiros sociais, a ministra do Trabalho atirou: “O nosso compromisso é com o país e com as pessoas. Desde o início que identificamos áreas muito críticas de intervenção e que precisam mesmo de uma resposta, do ponto de vista de um quadro regulatório mais forte. É isto que estamos a fazer. As posições diferentes dos vários parceiros não permitiam que houvesse uma única voz sobre as várias medidas que estamos a colocar em cima da mesa, mas são medidas que o país precisa.”

Na Concertação Social procede agora a discussão sobre o acordo sobre competitividade e rendimentos, que o Governo quer ver concluído até ao outono. Nesse âmbito, será discutido, por exemplo, o reforço do valor a pagar pelas horas extraordinárias feitas pelos trabalhadores, medida que chegou a estar enquadrada na Agenda do Trabalho Digno, mas acabou por ser atirado para outro âmbito.

“A nossa opção foi muito clara. Procuramos que todas as matérias que têm a ver com rendimentos e áreas financeiras e fiscais, sejam todas parte da discussão e da negociação no âmbito do acordo de rendimentos e competitividade”, explicou Ana Mendes Godinho, que detalhou que, nesse quadro, será também discutido o Fundo de Compensação Salarial e até a taxa de rotatividade, medida prevista desde 2019 no Código do Trabalho, mas que ainda não saiu do papel, tal como escreveu recentemente o Jornal Económico.

Quanto ao acordo sobre competividade e rendimentos, está prevista a criação de um grupo de trabalho para identificar as metas e as matérias a incluir. Ainda não é certo, portanto, quando tais medidas produzirão efeitos.

A próxima reunião da Comissão Permanente da Concertação Social está marcada para 29 de junho, adiantou a ministra.